Para verificar se o NT é um registro fidedigno da
história, precisamos responder a duas perguntas em relação aos documentos que
compõem o NT:
1. Temos cópias precisas dos documentos
originais que foram escritos no século I?
2. Esses documentos falam a verdade?
Vamos começar com a pergunta número 1.
Temos cópias precisas?
Temos certeza de que você se lembra da brincadeira
infantil chamada "telefone sem fio". Era uma brincadeira na qual uma
criança recebe uma mensagem verbal para passar à próxima criança, que passa
aquilo que ouviu à criança seguinte, e assim por diante. Quando a mensagem
chega à última criança na seqüência, ela é uma péssima representação daquilo
que a primeira criança ouviu. Para o observador comum, esse parece ser o mesmo
tipo de distorção que poderia ter infectado documentos que foram transmitidos
de geração a geração num espaço de 2 mil anos. Felizmente o NT não foi
transmitido dessa maneira.
Uma vez que não foi contado a uma pessoa, que o
contou a outra, e assim por diante, a brincadeira do telefone não se aplica.
Várias pessoas testemunharam acontecimentos do NT de modo independente, muitas
das quais os registraram em sua memória, e nove dessas testemunhas
oculares/contemporâneas registraram suas observações por escrito. Neste
momento, precisamos esclarecer um conceito errado muito comum sobre o NT.
Quando falamos dos documentos do NT, não estamos falando de um único texto, mas
de 27 textos.
Os documentos do NT são 27 documentos diferentes,
escritos em 27 rolos diferentes, por nove autores, num período de 20 a 50 anos.
Esses textos específicos desde então foram reunidos em um único livro que hoje
chamamos Bíblia. Desse modo, o NT não é uma fonte única, mas uma coleção de
fontes. Existe apenas um problema: até agora, nenhum dos
documentos escritos originais do NT foi descoberto. Temos apenas cópias dos
textos originais, chamados manuscritos. Isso pode nos impedir de saber o que
diziam os originais? De modo algum. De fato, toda literatura significativa do
mundo antigo é reconstituída à sua forma original ao se comparar os manuscritos
que sobreviveram.
Para reconstruir-se o original, é muito útil termos
um grande número de manuscritos produzidos não muito tempo depois do original.
Maior quantidade de manuscritos e manuscritos antigos normalmente nos dão um
testemunho mais confiável e geram condições para uma reconstrução mais precisa.
Como os documentos do NT se saem nesse aspecto? Muito bem, melhor do que
qualquer outro material do mundo antigo. De fato, os documentos do NT possuem
mais manuscritos, manuscritos mais antigos e manuscritos mais abundantemente
apoiados do que as dez melhores peças da literatura clássica combinadas.
Veja a seguir o que queremos dizer com isso.
Mais manuscritos. De acordo com a última contagem, existem
cerca de 5.700 manuscritos gregos do NT escritos à mão. Além disso, existem
mais de 9 mil manuscritos em outras línguas (e.g., siríaco, copta, latim,
árabe). Alguns desses quase 15 mil manuscritos são bíblias completas, outros
são livros ou páginas, e somente alguns são apenas fragmentos. Não existe nada
no mundo antigo que sequer se aproxime disso em termos de apoio a manuscritos.
A obra mais próxima é a llíada, de Homero, com 643 manuscritos. A maioria das
outras obras antigas sobrevive com pouco mais de uma dúzia de manuscritos.
Contudo, poucos historiadores questionam a historicidade dos eventos que essas
obras registram.
Manuscritos mais antigos. O NT não apenas desfruta de
um amplo apoio dos manuscritos, como também possui manuscritos que foram
escritos logo depois dos originais. O mais antigo e incontestável manuscrito é
um segmento de João 18.31-33,37,38, conhecido como fragmento John Rylands
(porque está na Biblioteca John Rylands, em Manchester, Inglaterra). Os estudiosos
datam esse documento como tendo sido escrito entre 117 e 138 d.e, mas alguns
dizem que ele é ainda mais antigo. O fragmento foi encontrado no Egito próximo
ao mar Mediterrâneo, e seu provável local de composição foi a Ásia Menor –
demonstrando que o evangelho de João foi copiado e levado a lugares distantes
logo no início do século 11.
Existem nove fragmentos discutíveis, ainda
mais antigos que o fragmento John Rylands, que datam do período que vai do ano
50 ao 70 d.e, encontrados com os Manuscritos do mar Morto. Alguns estudiosos
acreditam que esses fragmentos são parte de seis livros do NT, incluindo
Marcos, Atos, Romanos, 1ª Timóteo, 2ª Pedro e Tiago. Embora outros estudiosos
resistam a essa conclusão (talvez porque admitir isso seria uma afronta à sua
inclinação liberal de que o NT foi escrito posteriormente), eles não
encontraram nenhum outro texto que não fosse do NT ao qual esses fragmentos
pudessem pertencer.
Confiabilidade do Novo Testamento
quando comparado com os outros documentos antigos
Os fragmentos foram encontrados numa caverna que,
anteriormente, fora identificada como uma que possuía material cuja datação
variava de 50 a.C. a 50 d.C. O primeiro estudioso a identificar esses
fragmentos antigos como livros do NT foi José O'Callahan, um destacado
paleógrafo espanhol. O New York Times reconheceu as
implicações da teoria de O'Callahan ao admitir que, se eles fossem verdadeiros,
"então provariam que pelo menos um dos evangelhos – o de S. Marcos – foi
escrito apenas alguns anos depois da morte de Jesus".
Mas mesmo que não fossem fragmentos verdadeiros do
NT e se o fragmento John Rylands fosse realmente o mais antigo, o espaço de
tempo entre o original e a primeira cópia ainda existente é muitas vezes menor
do que qualquer outro do mundo antigo. A Ilíada tem o segundo menor espaço, que
é de cerca de 500 anos. A maioria das outras obras antigas está distante mil
anos ou mais do original. O espaço do NT, de cerca de 25 anos, pode ser menor
(isso não significa que não tenha havido outros manuscritos
entre o original e a primeira cópia; eles certamente existiram.
Isso simplesmente significa que esses manuscritos
deterioraram-se, foram destruídos ou até mesmo não foram descobertos ainda).
Qual é a idade do mais antigo manuscrito de um livro completo do NT?
Manuscritos que formam livros inteiros do NT sobreviveram a partir do ano 200
d.C. E quanto aos mais antigos manuscritos do NT completo? A maioria dos
manuscritos do NT, incluindo os quatro evangelhos, sobrevive desde o ano 250, e
um manuscrito do NT (incluindo um Antigo Testamento em grego), chamado Códice
Vaticano, sobrevive desde o ano 325.
Vários outros manuscritos completos sobrevivem
desde aquele século. Esses manuscritos possuem ortografia e pontuação
características que sugerem ser parte de uma família de manuscritos que pode
ter sua origem entre 100 e 150 d.C. Se esses numerosos e antigos manuscritos
fossem tudo o que os estudiosos possuíssem, poderiam reconstruir o NT original
com grande precisão. Mas eles também possuem abundantes evidências de apoio do
mundo antigo que fazem a reconstituição do NT ser ainda mais precisa. Vamos
analisar isso a seguir.
Grande quantidade de manuscritos de apoio.
Começando em fevereiro do ano 303 d.C., o imperador romano Diocleciano
promulgou três editos de perseguição aos cristãos porque acreditava que a
existência do cristianismo estava rompendo a aliança entre Roma e seus deuses.
Os editos pediam a destruição das igrejas, dos manuscritos e de livros, assim
como a morte dos cristãos. Centenas, se não milhares, de manuscritos foram
destruídos por todo o Império Romano durante essa perseguição, que durou até o
ano 311.
Mas mesmo que Diocleciano tivesse sido bem-sucedido
em varrer da face da Terra todos os manuscritos bíblicos, ele não poderia ter
destruído nossa capacidade de reconstruir o NT. Por quê? Porque os pais da igreja
primitiva – homens dos séculos 11 e 111 como Justino Mártir, Ireneu, Clemente
de Alexandria, Orígenes, Tertuliano e outros – fizeram tantas citações do NT
(36.289 vezes, para ser exato) que todos os versículos do NT, com exceção de
apenas 11, poderiam ser reconstituídos simplesmente de suas citações.
Em outras palavras, você poderia ir até a
biblioteca pública, analisar as obras dos pais da igreja primitiva e ler
praticamente todo o NT simplesmente com base nas citações que eles fizeram!
Desse modo, nós não apenas temos milhares de manuscritos, mas milhares de
citações desses manuscritos. Isso torna a reconstrução do texto original
praticamente precisa. Mas quão precisa? Como os originais são reconstruídos e
quão preciso é este NT reconstruído?
Como o original é reconstruído?
Esses três fatos – manuscritos em quantidade,
antigos e de apoio – ajudam os estudiosos a reconstruírem os manuscritos
originais do NT de maneira bem fácil. O processo de comparar muitas cópias e
citações fornece uma reconstrução extremamente precisa do original, mesmo que
erros fossem cometidos durante a cópia. Como isso funciona? Considere o exemplo
a seguir. Suponha que tenhamos quatro diferentes manuscritos, os quais possuem
quatro erros diferentes no mesmo versículo, como Filipenses 4.13 ("Tudo
posso naquele que me fortalece"). Vejamos as quatro cópias hipotéticas:
1. Tudo posso naquele que me fortalece
2. Tudo posso naquele que me fortalece
3. Tudo posso naquele que me fortalece
4. Tudo posso naquele que me fortalece
Há algum mistério em relação àquilo que o original
dizia? De modo algum. Pelo processo de comparação e de verificação cruzada, o
NT original pode ser reconstruído com grande precisão. A reconstrução do NT é
ainda mais fácil que isso, porque existem muito menos erros nos manuscritos
verdadeiros do NT do que os que foram representados nesse exemplo. Vamos
presumir por um instante que o NT seja realmente a palavra de Deus. Os céticos
podem perguntar: "Bem, se o NT é realmente a palavra de Deus, então por
que Deus não preservou o original?".
Só podemos especular aqui, mas uma possibilidade é
porque sua palavra pode ser melhor protegida por meio de cópias do que por meio
de documentos originais. Como assim? Porque, se o original estivesse de posse
de alguma pessoa, essa pessoa poderia alterá-lo. Mas, se houvesse cópias
espalhadas por todo o mundo antigo, não haveria maneira de um escriba ou
sacerdote alterar a palavra de Deus. Como vimos, o processo de reconstrução
permite que variantes e alterações nas cópias sejam identificadas e corrigidas
de maneira bastante simples. Desse modo, ironicamente, o fato de não existirem
originais pode preservar a palavra de Deus de uma maneira melhor do que se eles
existissem.
Quão precisa é essa reconstrução?
Com o objetivo de abordar a questão da precisão,
temos de esclarecer alguns mal-entendidos de muitos críticos em relação a
"erros" nos manuscritos bíblicos. Alguns já chegaram a estimar que
existem cerca de 200 mil erros nos manuscritos do NT. Primeiro de tudo, eles não
são "erros", mas leituras variantes, a maioria das quais de natureza
estritamente gramatical (i.e., pontuação e ortografia). Segundo, essas leituras
estão espalhadas por cerca de 5.700 manuscritos, de modo que a variação na
ortografia de uma letra de uma palavra em um versículo em 2 mil manuscritos é
considerada 2 mil "erros".
Os especialistas em texto Westcott e Hort estimam
que apenas uma em cada 60 dessas variantes tem significância.
Isso levaria a um texto com grau de pureza de 98,33%. Philip Schaff calculou
que, das 150 mil variantes conhecidas em seus dias, somente 400 mudaram o
significado da passagem, apenas 50 foram de real importância e nem mesmo uma
sequer afetou "um artigo de fé ou um preceito de obrigação que não seja
abundantemente apoiado por outras passagens indubitáveis ou pelo sentido geral
do ensinamento das Escrituras".
Nenhum outro livro antigo é tão bem autenticado. O
grande estudioso do NT e professor da Universidade de Princeton, Bruce Metzger,
estimou que o Mahabharata, do hinduísmo, foi copiado com apenas 90% de precisão
e que a Ilíada de Homero, com cerca de 95%. Por comparação, ele estimou que o
NT é cerca de 99,5% preciso. Mais uma vez, o 0,5% em questão não afeta uma
única doutrina da fé cristã. Fredric Kenyon, autoridade em manuscritos antigos,
resumiu muito bem a situação do NT quando escreveu:
“Não se pode afirmar com plena firmeza que, em
substância, o texto da Bíblia seja inquestionável. Em especial, essa é a
situação do Novo Testamento. O número de manuscritos do NT, de traduções
antigas dele e de suas citações pelos antigos autores da igreja é tão grande
que é praticamente certo que a verdadeira leitura de toda passagem dúbia esteja
preservada em uma ou outra dessas autoridades antigas. Não se pode dizer isso
em relação a nenhum outro livro antigo do mundo"
Por: Norman Geisler e Frank Turek.